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Como uma família açoriana preparou uma volta ao mundo em catamarã
Fomos encontrar o Armindo com os dois filhos no catamarã, na marina de Ponta Delgada. Estava calmo e convicto de que hoje de manhã deixa a marina de Ponta Delgada com um primeiro destino dependente dos ventos que vai encontrar. Sai com uma ‘alta pressão’, “com um solinho para as crianças irem brincando, para rirmos, fazermos festa”, como diz. Em princípio, vão começar a navegar até ao Porto Santo porque vão apanhar ventos de frente. “Posso ter que navegar nos 50 graus, mas isso pode cansar a família. Se isso suceder, abro mais um pouco e logo vejo se, mesmo assim, consigo chegar ao Porto Santo. Se a família estiver bem e o barco estiver tudo bem, há a possibilidade de irmos de vez para as Canárias. Assim, fico logo numa latitude que me permite estar mais tranquilo com a família para uma segunda etapa que será Cabo Verde”.
“Depois, já quase na linha do Equador, avanço para as Caraíbas até ao Panamá. Subo o elevador até ao Pacífico e tenho as ilhas pérola, Galápagos, e, depois, a Polonésia Francesa que fica a 25 a 30 dias de viagem. Será o maior período de tempo que vamos estar no mar “.
Quando o ‘Correio dos Açores’ estiver impresso e começar a ser distribuído logo às primeiras horas da manhã, a bordo do iate, Armindo já pensa em navegar. Mas só deverá sair da Marina por volta das 10h00. “Há muitos anos que ando de barco e sempre foi meu desejo fazer a minha primeira viagem. Que eu me lembro ‘a minha primeira vez’ no mar foi com cinco anos ao o Ilhéu de Vila Franca com meu tio. Eu era tão pequenino que ficava com os olhos de fora e o resto do corpo todo metido dentro do caiaque. Estava sentado no fundo do caiaque e aquele som do mar a bater fazer um eco assustador. Eu achava que o mar é que estava a fazer todo aquele barulho e que o mar tinha um poder incrível e a verdade é que tem”.
Armindo residia em Vila Franca e a família veio para Ponta Delgada. “Aproximei-me do clube e comecei a fazer canoagem e vela. Com 14 anos comecei a fazer iatismo com o senhor Jorge Raposo. Ele só agarrava a barra do leme e eu fazia tudo: Desamarrava o barco, subia, afinava e risava as velas. Já tinha muita à-vontade no mar em termos de vela de cruzeiro. Aos 17 anos realizei, pela primeira vez, o meu sonho de navegar de iate em alto mar, contra a vontade de meus pais. Foi fugir praticamente de casa e fui para Vilamoura”.
“ Aos 22 anos fui buscar um barco a Portimão para Ponta Delgada. Fui buscá-lo a França, vim com o proprietário até ao Algarve mas a viagem foi muito mais difícil com ele do que sozinho. Em Portimão disse ao proprietário que se ele quisesse o barco em São Miguel teria de vir de avião e foi o que aconteceu. E, depois, nunca mais parei até ter o meu barco. E tudo aconteceu de forma cruel. Estive quatro anos a reparar um barco para o ter a navegar e, basicamente, nunca cheguei a navegar neste barco. Vendi-o e comprei o ‘Cosmopolite’. Comecei a fazer alguma coisa com ele que justificasse a minha existência. Só que, entretanto, encontrei a Joana, pusemos a hipótese de filhos e fizemos dois. A minha paixão à Joana foi porque ela alinhava numa coisa desta natureza. Começamos a desenvolver, a criar e a massificar a iniciativa, até que conseguimos chegar aqui depois de muito esforço, depois de uma ‘nega’ enorme do Governo dos Açores que nos fez repensar todo o projecto. Tivemos que tornar o nosso barco autónomo. Inicialmente, pensámos ir para marinas mas, para isso, precisávamos de muito mais dinheiro. O apoio do Governo não apareceu e o barco é, agora, praticamente autónomo e só precisamos de um dessalinizador para termos água potável a bordo a tempo inteiro sem termos de ir a terra buscá-la. Espero que haja uma empresa simpática que queira assumir esta conta em troca de outras contrapartidas. Neste momento, com o dinheiro que levamos e com o que precisámos, o dessanilizador continua a ser uma miragem”.
“O que desejo é ter a família em harmonia, satisfeita, feliz e contente. Temos a Somália que é o ponto vital da pirataria que nos deixa muito apreensivos e nos vai fazer descer bastante a Sul e afastados do contacto com aquele pessoal”.
“O nosso objectivo, já no Índico, é passar a Indonésia, subimos à Tailândia e, depois, descer até Madagascar, já no Sul, passamos pela África do Sul . Gostava muito de ir a Moçambique. Gostava mesmo muito. Mas terei de me informar quando estiver mais perto porque também há informação de que existem piratas na zona. Depois, lentamente, farei a costa africana até Cape Town. Da cidade do Cabo devo ir para Santa Helena, passo o meridiano da volta ao mundo em direcção ao Brasil. Ou seja, a minha volta ao mundo acaba e começa no meridiano, na longitude 37”.
“Levar as crianças comigo não é nada de transcendente. É já habitual no mundo do iatismo encontrarmos famílias em iates com crianças e este mundo dos iates é o meu mundo. Não há nada que não se faça tranquilamente. Temos é de ter calma e fazer as coisas nos momentos certos”.
“Vamos carregados de lembranças dos Açores. Levamos uma caixa cheia de coisas. Levamos artes de pesca em cartazes, levamos as bonecas de folhas de milho, levamos os apitos em barro de Vila Franca, levamos areia preta, pedra pomes, cascalho, é uma lista enorme e infindável de coisas açorianas. A Joana e que está a tratar disso porque estou constantemente a preparar o barco com electrónica”.
Toda a estrutura de painéis solares que montei no barco deu-me muito trabalho. Ela foi desenhada por mim, cortada por mim e pela Serralharia do Outeiro, mas toda ela orientada por mim. Esta é uma obra basculante que sobe e desce e é um trabalho que demorou muito para ficar com o nível que está e eu orgulho-me desta peça que aqui está. Os painéis solares carregam as baterias e as baterias alimentam toda a electrónica e frigoríficos. Temos um barco cheio, com autonomia para quase um mês. Depois, vamos ter que pedir apoios e continuar a pedir apoios, criando estratégias para conseguir alimentar o projecto que, em termos económicos, é muito deficitário. Mas vamos partir, temos este sonho e vamos largar da marina. A minha vida foi sempre de trabalho e se for preciso continuar a trabalhar é o que farei. Tenho uma placa que diz ‘boat service’. E quando precisar de dinheiro ponho a placa do lado de fora da porta e as pessoas procuram sempre, a toda a hora, alguém que os possa ajudar. Em geral, os iatistas são pessoas que toda a sua vida foram médicos, engenheiros e doutores. E eu, felizmente, toda a minha vida fui iatista e toda a minha vida tive uma empresa que se dedicou à manutenção e venda de artigos de embarcações. Portanto, sou bastante conhecedor da área o que me permite, no fundo, partir…”
“Tenho as condições necessárias para fazer esta viagem com dois filhos que são o que mais amo na vida e a minha mulher, que me ajudou incondicionalmente neste projecto”.
Na sua página no Facebook fomos encontrar a determinação em poucas palavras: “Foram 4 meses a morar na Marina de Ponta Delgada. Quatro meses de preparação intensa e finalmente aproxima-se o grande dia! Domingo (hoje) partimos”.
A família em discurso directo
“Quando decidimos que queríamos dar a volta ao mundo à vela imaginámos que daria muito trabalho chegar ao dia da partida. Agora, que este dia está próximo, posso dizer-vos:
– Deu muuuuuuito mais trabalho do que eu imaginava!
Sinceramente, deu tanto trabalho chegar aqui, que várias vezes nos perguntamos porque o fazíamos e por vezes até pensámos em desistir… Ainda bem que não o fizemos. Agora já passou! Para uma família abastada ou altamente patrocinada, que compre feito e mande fazer, será certamente mais fácil. Tudo depende do projecto em questão, do barco que se tem, dos meios de que se dispõe e do que se pretende. Obviamente, não existem check-lists universais. Cada um tem de fazer a sua. Partilho aqui a nossa, num formato abreviado, mas que permite terem uma ideia mais clara do que foi organizar a partida para uma aventura destas e que com certeza responderá a algumas das vossas questões!
3 anos a escolher o barco certo – tínhamos um monocasco mas depois de experimentar um catamarã decidimos que tínhamos de mudar de barco! Foi uma longa procura, acho que o Armindo fez um “doutoramento” na área, pelo tempo que passou na net a ver sites de barcos… E porquê um catamarã? Tem mais espaço, mais luz, não temos de viver de lado (quando estamos a velejar), a sala e cozinha (locais onde passaremos mais tempo) ficam à tona da água e têm vista para o mar;)
(In)Definição da rota – há cerca de 2 anos começamos a planear a rota. Como adoramos e nos identificamos bem mais com a América Latina escolhemos a rota de Magalhães. Sonhámos e estudámos toda a costa atlântica deste maravilhoso continente, traçamos o caminho por entre os incríveis fiordes da Patagónia, imaginámo-nos a beber um whisky com gelo do glaciar, a conhecer a maravilhosa flora e fauna e depois de centenas de horas de net a estudar o assunto, recebemos a recusa de uma seguradora em nos fazer um seguro da viagem por causa da rota. Começamos a pensar, ponderamos e concordamos, eles tinham razão! Há 4 meses mudamos para a actual rota (vamos pelo canal do Panamá). E eles nem sabiam que ¾ da tripulação nunca velejou além Açores!…
Pobres crianças, e se ficam doentes? – Sabemos que este é o primeiro pensamento de muita gente e, sim, estaremos por vezes muito longe de um hospital. Mas não tanto como alguns pensam, a maior parte do tempo estaremos em terra e muitas das travessias serão inferiores a 4 dias. De qualquer maneira, houve uma grande preparação a este nível, fizemos exames médicos (eu até tirei a vesícula e o apêndice), consultas do viajante, fomos vacinados, levamos uma mini-farmácia projectada por um médico amigo e contamos com a tecnologia em caso de necessidade.
Vão viver de massas e enlatados?! – Não! Eu até dou muita importância a uma alimentação saudável (excepto nos doces… um aspecto a melhorar!) e sendo muitas das travessias inferior a 4 dias e porque temos congelador, frigorifico e uma caixa de frio (o frigorifico tem uma “portinha” que dá para um armário onde está sempre fresquinho) planeamos alimentarmo-nos da mesma maneira, com produtos frescos e locais. Levaremos viveres e água com fartura, até conseguirmos comprar o tão ambicionado dessalinizador
E a escola? – A Benita passou para o 2º ano e o Leonardo está a iniciar a pré-escola. Felizmente, no nosso País é permitido o Ensino Doméstico (nem tudo é mau!) e nós, os pais, vamos dar-lhes as aulas. Tivemos o apoio da escola da Benita (Colégio do Castanheiro) e da querida professora Liliana que nos disponibilizou toda a informação sobre as metas curriculares e preparou material quanto baste, Compramos os manuais adoptados pela escola para o 2ª e 3ª anos e com o apoio da Porta Editora, teremos acesso gratuito à Escola Virtual. E sinceramente, com uma viagem destas no currículo, escola não lhes vai faltar! Terão aulas práticas de Geografia, Ciências, História, Inglês, Desporto com fartura – Vão aprender a velejar, surfar, etc., – aprenderão a respeitar a diferença e a admirar e reconhecer o verdadeiro tamanho da nossa Casa.
E o papel? – Que papel? – O papel! – Quanto a documentos, vivemos num mundo burocrático, já se sabe… Passaportes, cartões de cidadão, certificados de nascimento (no caso de ser necessário renovar o passaporte fora do país), documentos do barco (como o novo barco é belga e além da mudança de dono mudamos-lhe o nome, tivemos de tratar ainda de mais papeis), bancos (cartões de crédito, cartões pré-pago, escolher bancos, fechar contas, abrir contas), seguros, venda do carro, aluguer da casa e por daqui em diante. É preciso tratar. Ponto.
E vão viver do quê? – Este é logo o primeiro limite que a nossa cabeça nos quer impor! Connosco não funcionou. Poupamos durante os últimos 4 anos, temos alguns rendimentos e não temos medo de trabalhar. Trabalhamos muito para chegar aqui e planeamos continuar a trabalhar…
E o que levam? – Como se imagina, o ir viver para um barco implica uma drástica redução de TUDO! Implica um árduo trabalho de SELECÇÃO. Seleccionar pouca coisa para levar, seleccionar o que é para dar, o que é para deitar fora, o que é para vender e o que é para encaixotar. Para as crianças foi um pouco mais difícil mas agora que reduziram os brinquedos para 1/10 não sentem falta dos restantes. Para mim, foi trabalhoso, mas um alívio. Agora temos menos para arrumar, para lavar, para secar, para gerir! Levamos pouca roupa, livros quanto baste, poucos brinquedos, material de desporto com fartura (padle, surf, badmington, windsurf, mergulho, bicicletas, skates, trotinete, etc.), algum material de comunicação (PC, ipad, rádio, telefone por satélite, antenas, material de vídeo e fotografia), algum material de segurança (coletes, arnês, EPIRB, AIS, apitos, lanternas, very-lights, mochila sos) e Muita ferramenta!
E então, é simples?
Muitos sonhos, alguns planos e 10 objectivos
1. Pretendemos perceber os lugares, trocar aprendizagens, criar laços, recolher histórias e tentar deixar algo por onde passarmos. Visitaremos Escolas, Associações, ONG’s ou outras organizações, para nos apresentarmos, dar a conhecer de onde vimos e o que estamos a fazer. Nestes contactos usaremos a Caixa dos Açores, que transportará elementos relacionados com o património cultural, histórico, geológico e geográfico da nossa Região e onde haverá uma saco vazio, onde convidaremos as pessoas a colocarem algo sobre a sua terra, para, juntamente com imagens e outros conteúdos, concebermos, no nosso regresso, uma exposição itinerante que nos permita partilhar com todos a nossa viagem;
2. Em parceria com a Global Compact, divulgar os 17 Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) definidos pelas Nações Unidas pelos portos identificados no itinerário através da entrega de pen’s USB de cortiça, a ONG’s, Associações e outras entidades previamente identificadas;
3. Em parceria com o GRACE, pretendemos promover a partilha global de boas práticas de Responsabilidade Social.
4. Enquanto voluntários da Sailors For the Sea – Portugal, e com o apoio desta organização, pretendemos realizar actividades de consciencialização para a sustentabilidade dos Mares e Oceanos dirigidas a crianças (escolas, ONG´s, etc.);
5. Pretendemos mapear açorianos pelo mundo, assim como manifestações açorianas, que divulgaremos neste site promovendo assim a valorização da cultura e gentes açorianas;
6. Procuramos aumentar a união familiar. Sentimos que vivemos numa Sociedade orientada para o trabalho, com requisitos que muitas vezes nos impedem de nos dedicarmos a amar, cuidar e educar verdadeiramente os nossos filhos. Questionamos se está certo que os professores passem mais tempo com os nossos filhos do que nós e qual será o impacto disto nas famílias e na própria Sociedade;
7. Pretendemos que seja um “gap year” para todos, um intervalo para encontrarmos novos interesses, desenvolver novos talentos, aprender com outras culturas, com a diversidade e a maravilhosa multiculturalidade que se tornará acessível e que tanto nos pode ensinar sobre desafios, tolerância e compaixão;
8. Dar oportunidade aos nossos filhos de se desenvolverem num formato diferente, onde todas as perguntas são válidas, todos os desafios e problemas superáveis, onde a aprendizagem se faz pela experiência e onde a autonomia e a preocupação ambiental são tão importantes como aprender a ler. Pretendemos ainda dota-los de competências de “marinheiragem” para que possam tornar-se também velejadores;
9. Enquanto psicóloga e mãe, venho a alimentar a ideia de, durante esta viagem, não só fazer o meu Diário de viagem, como incentivar a minha filha Benita, de 6 anos, a fazer o seu, sem qualquer interferência minha, pois acredito que o resultado poderá ser muito interessante no sentido de podermos comparar a visão de um adulto e de uma criança sobre a mesma viagem e que viagem!
10. Partilhar as personalidades interessantes que se cruzarão connosco nesta Aventura”.
Bons ventos, é o nosso desejo!
Fonte: Correio dos Açores
1 Comentário neste artigo
PEREIRA
PORRA….NÃO CONSEGUI LER TUDO….ACHEI(ATÉ AO QUE LI) QUE FALTAVA QUALQUER COISA, COMO “GANHÁMOS A LOTARIA”….MAS ENFIM.