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Peixes defumados da Casa do Portinho da ilha Terceira

Peixes defumados da Casa do Portinho da ilha Terceira

Dois sócios começaram a apanhar e vender peixe e marisco vivo mas quiseram evoluir para a indústria. Fizeram várias experiências e apresenta-se agora no mercado terceirense e micaelense com vários peixes defumados e algumas edições especiais. Além dos peixes serem capturados no mar dos Açores, também é usada a faia da terra para dar mais sabor ao produto final. O empresário Tiago Silva diz que gostava de conseguir chegar ao mercado nacional e madeirense mas reconhece que os Açores são “o prato forte” destes produtos da Casa do Portinho e é assim que gostava que continuasse. A pandemia trouxe maior consciência para a necessidade de se adquirir e consumir produtos portugueses e houve uma maior valorização dos produtos portugueses onde se inclui a Casa do Portinho. 
 

A Casa do Portinho é uma empresa, sedeada na ilha Terceira, que tem vindo a ganhar mercado com peixe de valor menos rentável que transforma num produto de alto valor acrescentado, depois de defumado. Usam peixe do mar dos Açores, como o chicharro do alto, a veja, a cavala e o atum patudo, a que juntam uma técnica de defumagem a frio usando a faia da terra. Há ainda edições especiais em que juntam especiarias e plantas comestíveis como o perrexil ou funcho do mar, a estes peixes.
Mas esta é já uma evolução do negócio pois no início a empresa, que até tinha outro nome (Flying fish), dedicava-se ao comércio de peixe fresco e marisco vivo. Tinha surgido “no rescaldo da crise”, em 2016, por vontade dos amigos e sócios Tiago Silva e Tibério Barbeito ambos apanhadores de marisco, que passaram a rentabilizar assim as suas próprias apanhas.
Mas o projecto foi evoluindo, até do ponto de vista económico e “como tivemos sempre vontade de evoluir para a indústria e sempre achámos muita piada ao peixe defumado, em 2017 começámos a pensar nisso seriamente e começámos com experiências”, conta Tiago Silva.
Em 2018 participaram com uma ideia de defumar espécies capturadas na Região no Concurso Regional de Empreendedorismo. Alcançaram o segundo lugar e nunca mais pararam. Até o nome da empresa mudou para dar mais sentido a este projecto. Conta Tiago Silva que o nome Casa do Portinho, bem como o logótipo, surgiu porque a casa do Porto Martins onde começaram a fazer as primeiras experiências de fumeiro do mar, “fica muito perto do Porto do Guilherme, que costumamos chamar de Portinho, daí Casa do Portinho. A nossa casa tinha antigamente uma chaminé de mãos postas – que já não tem – mas que ficou como símbolo da marca. Tanto eu como o Tibério Barbeito começámos as nossas aventuras no mar, a mergulhar no Porto do Guilherme. Chamámos ao projecto Casa do Portinho”. 

Das experiências ao resultado final
Antes de avançarem para a fábrica, classificada como unidade produtiva artesanal pelo Governo Regional, onde Tiago Silva é o artesão responsável, foram fazendo várias experiências com diversos peixes. Inicialmente, confessa o empresário, escolheram peixes com menor valor comercial para experimentar esta técnica de defumagem. “Começámos com o chicharro do alto porque era o peixe que era mais facilmente acessível e mais barato para começar as experiências”, mas depois foi aprofundando conhecimento sobre esta técnica e entendeu que o chicharro do alto “é um peixe muito gordo – quase tão gordo como a cavala – e para defumar, particularmente em frio, convém ser um peixe o mais gordo possível”.
As experiências “saíram bastante interessantes” com o chicharro do alto e depois começaram a ponderar outros peixes. “A cavala já é defumada de forma regular em Inglaterra ou em França. Não a cavala com as nossas características, é uma cavala mais pequenina e menos gorda, daí alguma diferenciação entre o nosso produto e outros produtos similares”. A veja, “pelo menos que saibamos, também ninguém defuma” e o atum patudo raramente é usado para este tipo de produto, “usa-se mais a albacora”. Por isso esta escolha de peixes que actualmente a Casa do Portinho actualmente apresenta: atum patudo, cavala, chicharro do alto e veja.

Produto artesanal
Mas não é só o peixe capturado nos Açores que torna este produto tão especial. É que o material usado na defumagem também é tipicamente açoriano e endémico. 
Tiago Silva explica que há três tipos de defumagem: “a defumagem a frio com fumo verdadeiro; a defumagem com fumo líquido – com menor valor comercial e uma grande parte dos produtos consumidos no sul da Europa são defumados a frio desta forma – e depois há a defumagem a quente que, regra geral não é feita com fumo líquido”. O fumo líquido acaba por ser “um destilado do fumo que dá sabor a fumado e o produto acaba por ter menor valor”. Por isso a Casa do Portinho “defuma a frio, com fumo da faia da terra que é endémica da Região, que é mais um valor acrescentado bastante interessante”. 
Tiago Silva diz que normalmente a maior parte das empresas defuma os seus produtos com carvalho “e outras madeiras duras não resinosas”. Mas quando estava no processo de estudo do projecto fez uma pesquisa também ao nível das madeiras e procurou madeiras características dos Açores para puderem ser usadas no processo. “Por coincidência a faia da terra é uma madeira dura, não é resinosa, e ao ser usada também reciclamos por assim dizer, porque usamos os sub-produtos da limpeza das matas. Isso dá umas características bastante diferenciadas aos nossos produtos. Acaba por ser uma ajuda importante na originalidade do produto. Dá um sabor diferente”, destaca o empresário.
Além da qualidade do peixe e do sabor da faia da terra, têm sido feitas edições especiais usando por exemplo o perrexil ou funcho do mar para temperar a veja juntamente com a pimenta verde. “O funcho do mar é muito característico da Terceira e faziam-se conservas antigamente inclusive. Usámo-lo numa edição especial”, explica Tiago Silva. Há ainda edições especiais de chicharro do alto com cinco pimentas, atum patudo com pimenta da terra, ou cavala com pimenta preta. 
Mas a empresa tem-se aventurado também com outros peixes, embora ainda sem os explorar convenientemente por não terem rentabilidade. O empresário relata experiências para clientes mais particulares em que são usados lírios, anchovas ou mesmo encharéus. Peixes que “são muito bons” mas que em termos de comercialização não podem avançar. “Têm calibres muito díspares e o tamanho dos peixes é diferente. Não se consegue uma uniformização da produção e a venda em prateleira no retalho é mais perigosa porque o prazo de validade não é igual para todos. Além de que o preço final do produto é um pouco superior e decidimos por enquanto não avançar na produção e comercialização destes produtos”, refere.

Aumentar produção?
Neste momento a fábrica da Casa do Portinho não está ainda na sua capacidade máxima mas “pode chegar facilmente aos 200 quilos por semana em produto acabado”. No entanto, basta aumentar os equipamentos e aumentar a mão-de-obra para que facilmente a fábrica possa duplicar ou triplicar esta produção já que actualmente apenas os dois sócios e um colaborador são suficientes para fazer andar a fábrica. 
Para já os produtos da Casa do Portinho são distribuídos na Terceira já chegam a São Miguel e através de um distribuidor já chegam a Lisboa e ao Porto. São os Açores que absorvem a maior parte desta produção artesanal com a grande maioria a ser comercializada na ilha Terceira. “Mas temos um distribuidor em São Miguel – a Fat Tuna – que faz vendas porta-a-porta, e está planeada a entrada noutras superfícies comerciais. Quanto a exportação propriamente dita, a Fat Tuna acaba por enviar para Lisboa e Porto, que não é bem uma exportação mas é uma venda para fora da Região”, lembra o empresário. 
“Gostaríamos que os Açores continuassem a ter grande representação nas vendas. O que significava que as pessoas gostam dos produtos e eventualmente para turistas, uma espécie de exportação”, afirma Tiago Silva que acrescenta que a exportação não está ainda planeada porque “vai depender da evolução do projecto, mas em termos de vendas nacionais, se conseguíssemos entrar no mercado nacional e na Madeira era mais que interessante”. 
No entanto, ir além do território nacional pelo menos para já é algo que a empresa ainda não pensa por uma questão de logística e até de capacidade. “A exportação deste tipo de produto depende muito da cadeia logística e da capacidade produtiva. Das duas uma, ou conseguimos um contrato interessante com algum distribuidor relativamente pequeno ou então não conseguimos, porque não se consegue enviar contentores de frio daqui para França ou Espanha”, refere.
A qualidade do peixe dos Açores é superior e por isso é uma mais-valia usá-lo para defumar. Mas há peixes que são sazonais e é preciso fazer stock para ser posteriormente usado. Neste sentido, a Casa do Portinho faz a ultra-congelação de todo o peixe que usa “primeiro por uma questão de segurança alimentar, facilita a logística depois do sal, e uniformiza a produção propriamente dita”. É que, explica, os peixes “não são todos iguais e o facto de ser congelado e depois descongelado, uniformiza a salga, a secagem e todo o procedimento. Por isso fazemos stock para mais tarde usar”.

Pandemia ajudou
Sendo este um produto de alto valor acrescentado é agora mais valorizado, depois da pandemia. Tiago Silva diz que a pandemia “até acabou por apelar à consciencialização de Portugal, e dos Açores, para consumirmos o que é nosso, porque são produtos de qualidade, a bem de não haver uma extinção da economia nacional”. 
Desta forma o empresário entende que “houve uma certa valorização do que é nosso, e bem, que devia ter acontecido há mais tempo e não apenas devido à pandemia. Houve uma consciencialização que o mercado interno é interessante e que aquilo que costumamos produzir é melhor ou equivalente ao que se faz noutros países”. Por isso Tiago Silva entende que a pandemia até “acabou por ser um facilitador” para o consumidor conhecer os produtos da Casa do Portinho e aceder a eles. 
Uma variedade de produtos regionais que alia o tradicional à inovação e que quer consolidar mercados para este produto de alto valor acrescentado.

 Fonte: Correio dos Açores / Carla Dias

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