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José Vieira constrói o maior barco de sempre em São Miguel

José Vieira constrói o maior barco de sempre em São Miguel

Nos estaleiros navais de Rabo de Peixe já se construiu nove barcos por ano e agora constrói-se quatro a cinco.

Na oficina de José Vieira, em Rabo de Peixe, está a ser construída a maior traineira em madeira que já foi construída em São Miguel. A traineira com 15 metros de comprimento e 6,20 de largura deve estar concluída daqui a 4 ou 5 meses, mas os mestres já levam 4 meses de trabalho. A construção naval está com algumas quebras uma vez que desde o início do ano que não se podem construir novas embarcações em São Miguel, mas José Vieira diz que antigamente reconstruía 9 barcos por ano e agora são só 4 ou 5 mas “graças a Deus tenho trabalho até 2015”.

Junto à orla costeira em Rabo de Peixe a pequena porta de entrada do estaleiro da empresa naval J. Salvador, não faz adivinhar o que se encontra lá dentro. Quase a ocupar metade do comprimento do estaleiro e quase a tocar no tecto de zinco está um esqueleto de uma traineira já quase todo forrado.
Com 15 metros de comprimento e 6,20 metros de largura é o primeiro barco a ser feito em São Miguel com estas dimensões e sai das mãos do mestre José Vieira e dos seus quatro colaboradores. É um barco feito em madeira, que demora entre 9 meses a um ano para ficar terminado e os mestres já levam 4 meses de trabalho. “Os acabamentos é que demoram mais tempo porque o bruto faz-se bem”, explica José Vieira que já há 18 anos trabalha na indústria naval. 
O barco vai ter capacidade para 18 beliches, duche de água fria e água quente, duas casas de banho, cozinha, uma sala com televisão para os homens do mar descansarem e até vai ter uma antena de televisão para apanhar alguns canais mas quando “chega a umas certas milhas da costa não apanha nenhuns canais e então os homens colocam dvd’s para se poderem entreter”, garante o mestre.
A traineira vai ser usada para a pesca do atum com salto e vara e para a pesca de palangre de fundo “as duas artes que ainda dão algum dinheiro porque as outras artes estão praticamente paradas”, afirma José Vieira que acrescenta que um barco em madeira tem muito mais estabilidade que um barco de fibra ou de alumínio além de ser “um bom bocado mais barato, mas também exige mais manutenção”.
O mestre continua afirmando que “um barco de alumínio ou de fibra rola muito, ou seja, mexe muito e um barco de madeira é muito mais seguro”. As madeiras usadas para construir o barco com 15 metros são tradicionais, como o pinho branco para revestir o barco e a acácia tradicional para fazer a “ossada” ou o esqueleto da traineira. Como o pinho branco é escasso em São Miguel e “é proibido apanhar em São Miguel”, José Vieira manda vir pinho branco de Santa Maria mas nem por isso encarece a obra porque “ainda consegue ser mais barato do que o que se vende cá. Em São Miguel o pinho é escasso e quando há alguns pinheiros que se podem cortar, quando há vários serviços que obrigam a cortar os pinheiros, são vendidos a preço muito elevado e o de Santa Maria consegue ser mais barato”.
Quanto à técnica para “domar” a madeira e fazer o arredondado das tábuas que revestem o barco, José Vieira diz que é simples “usamos vapor para conseguirmos moldar a madeira especialmente na 1ª e 2ª tábuas mas já as outras basta um pouco de água na madeira e um maçarico e conseguimos dobrar as tábuas”, explica. 
Como o esqueleto do barco está praticamente a tocar no tecto, José Vieira diz que a ponte de comando vai ter de ser feita no estaleiro mas montada quando a estrutura do barco estiver fora da oficina e quanto ao facto do barco ser enorme e poder não sair pelo portão da frente, José Vieira diz que “tem a dimensão certa e foi tudo bem pensado” para que a traineira pudesse sair pela entrada principal.
Até porque antes de se dar início ao barco em si, há que fazer uma maquete à escala, que vai fazer depois os testes de estabilidade. “Temos de fazer testes de mar com a maquete que tem de passar nas revisões, nos testes de estabilidade e tem de passar nas provas para poder navegar e são coisas muito rigorosas porque são vidas que estão a bordo, é uma responsabilidade grande”.

 

“É uma vida que dá gosto”

José Vieira já trabalha na construção naval há 18 anos, 11 deles como trabalhador por conta doutrem e há 7 anos que se estabeleceu por conta própria. Já tem 4 colaboradores a trabalhar consigo a quem ensinou o que também outros já lhe tinham ensinado. “Eles já há 6 anos que estão comigo, que é o tempo que tenho esta oficina e tem corrido bem”, apesar de acrescentar que nunca deixa de supervisionar todos os passos porque por mais que sejam profissionais e que trabalhem bem, “temos sempre de confirmar tudo porque há coisas que têm de estar 100% perfeitas como a montagem dos motores ou dos geradores porque disso pode depender a vida dos homens que vão trabalhar no barco”, acrescenta. Há 18 anos nesta vida José Vieira diz que por vezes ainda tem receio “porque pensamos que o barco pode não estar com pensamos mas até agora nunca me falhou nenhum” diz com orgulho, afirmando que a primeira viagem que um barco faz no mar é sempre pelas suas mãos. É por isso que é mecânico de embarcações e também tem carta de mestre, para fazer sempre a primeira viagem “para ver se está tudo operacional” e conta que ainda há dias teve de ir levar um barco à Ribeira Quente que durante a viagem teve um problema de motor “como tenho curso de mecânico remediei o problema mesmo em alto mar e o dono do barco ficou satisfeito porque tinha alguém a bordo que percebesse do assunto, senão o barco tinha de ser rebocado”. 
Mas a indústria naval já teve melhores dias. José Vieira afirma que desde o início deste ano é proibido fazer construções novas “só se podem fazer reparações e reconstruções porque a ilha é pequena, já há muitos barcos e o peixe está escasso”, afirma.
No entanto o mestre diz que não se pode queixar “graças a Deus tenho serviço garantido até 2015. Conforme os dias vão andando pode haver mais um concerto, uma reparação mas se não aparecer até 2015 tenho trabalho”.
Mas “está a ficar complicado” pois antes fazia uma média de 9 barcos por ano e agora faz só “quatro ou cinco porque os dinheiros levam muito tempo a chegar e nem sempre é a secretaria regional porque às vezes são mesmo os proprietários pois se devem dinheiro à segurança social ou às finanças o dinheiro não chega”, revela. 
Durante a construção de um barco, José Vieira revela que há pequenos rituais que têm de ser cumpridos. “Quando metemos a quilha e a roda, o dono tem de trazer um petisco para comermos e alguma coisa para bebermos. Quando se começa a forrar é a mesma coisa e quando acabamos o barco e ele é baptizado é uma festança, aparece muita gente aí”, descreve o mestre que acrescenta que na primeira viagem do barco até ao porto, “a meio da viagem para-se o barco e também se come um petisco”. 

Barco reparado para passeios

Ao lado da grande traineira, está na oficina de José Vieira uma outra embarcação. O primeiro barco que fez em 2004 “enquanto estava a pensar montar-me por minha conta e fi-lo em casa”. Demorou um mês e uma semana a ficar concluído “mas os vizinhos reclamaram muito comigo porque eu ficava até à 1 ou 2 da manhã para trabalhar. Fazia por dia 12 a 15 horas de trabalho, é um barco muito rápido de fazer”.
Vendeu-o depois para o continente “para o filho do empresário Sousa Cintra que o ofereceu à esposa para atravessar e passear no rio Tejo”. O casal comprou outra casa desviada do rio e já não precisam da embarcação e mandou-ma de volta.
Como José Vieira também gosta de “andar no mar” vai reparar a embarcação porque “está a precisar de uma pintura” e pode ser usado para pesca porque está registada para pesca de recreio. Tem lotação para 7 pessoas e para pesca de recreio “cada pessoa pode apanhar 7,5 quilos de peixe ou então 5 peixes grandes”, revela. 
Mas José Vieira tem ainda outra ideia para o barco. “Tenho aqui muitas visitas de estudo na oficina e os miúdos querem dar umas voltinhas de barco”, mas para isso é necessário ter autorização da Capitania mas “quero ver se este Verão ele já navega”.
Como se trata de crianças “a Capitania tem de dar autorização e tem de ir um agente da Polícia Marítima connosco” para garantir a segurança dos mais pequenos que têm muita curiosidade quando se deslocam à oficina a Rabo de Peixe. 
Uma possibilidade para a embarcação que foi construída em 2004, que já navegou no rio Tejo e que pode agora ser usada para pequenos passeios em jeito de visita de estudo para mostrar aos mais novos que depois de tanto trabalho nos estaleiros os barcos que são feitos em Rabo de Peixe são sólidos e estáveis.

Fonte: Correio dos Açores

1 Comentário neste artigo

  1. José Marques

    Parabéns ao estaleiro de Rabo de peixe pela grande construção desta embarcação,entre outras
    Muito sucesso para 2015,Acores na rota do mundo
    Já tive o prazer de visitar este estaleiro na companhia do Sr José
    Grande abraço ao José Vieira
    Cumpts
    Jmarques
    Vila do conde

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