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São Miguel // Pescadores de chicharro dizem que “estão a viver numa situação de desgraça”
Nós últimos três dias só pescaram 234 quilos de chicharro quando deviam ter capturado, cumprindo o limite máximo, 13,2 toneladas. Na lota o chicharro já atingiu os 14 euros por quilo e está a um preço médio de 8.50 euros. Mas este valor só chega a um e outro barco e não compensa os gastos com os combustíveis. No mercado de São Miguel não existe chicharro há muito tempo e tão poucas quantidades só são vendidas aos restaurantes que pagam mais…
Os onze barcos de chicharro de São Miguel estão a viver momentos de “autêntica desgraça”, sem rendimentos suficientes para sustentar a família face à falta de chicharro e de atum no final do mês passado e princípio deste mês.
Numa situação normal, cada um dos onze barcos pode pescar até 400 quilos de chicharro, o equivalente a 4,4 toneladas de chicharro por dia. Entre os dias 1 e 3 deste mês descarregaram apenas 234 quilos de chicharro (praticamente metade de um só barco) que foram vendidos em lota a um preço médio de 8,46 euros o quilo. Houve chicharro que chegou a atingir os 14 euros em lota. São preços elevados que se diluem muito nos custos.
Não basta considerar que, havendo menos peixe, este peixe é vendido a um preço mais elevado. Isto porque, para pescar os 234 quilos de chicharro, os onze barcos tiveram que gastar mais combustível na procura do peixe e tiveram outros custos que, subtraídos ao preço de venda em lota, levam a um rendimento muito baixo para as tripulações.
Quando alargámos o período de pesca entre o dia 28 de Abril e 3 de Maio, foram pescados 266 quilos de chicharro vendidos em lota a um preço médio de 8.30 euros o quilo.
E se alargarmos mais este período entre 25 de Abril e 3 de Maio, os onze barcos ‘chicharreiros’ capturaram 605 quilos de chicharro que foram vendidos em lota a um preço médio de 4.97 euros o quilo.
De Janeiro a Abril deste ano, numa situação normal, os onze barcos ‘chicharreiros’ , se pescassem a quota a que têm direito, teria capturado 528 toneladas de chicharro ao longo dos quatro meses. Contudo, neste período, os barcos ‘chicharreiros’ pescaram 26,5 toneladas de chicharro miúdo a 4.15 euros o quilo, o equivalente a 110.244 euros. No mesmo período, capturaram 45,8 toneladas de chicharro do alto, no valor de 93 mil euros, o que sai a um preço médio em lota de 2.03 euros o quilo.
O pouco chicharro que passa na lota é adquirido por intermediários que, em vez de os colocarem nas grandes superfícies comerciais, preferem vender o peixe nos restaurantes a preços mais compensadores. E há também o chicharro, como nos disse ontem um armador no porto de Ponta Delgada, que não passa na lota e alguns pescadores vendem “como se fosse droga a passar no mercado negro” a preços mais compensadores, uma forma de obter maior rendimento para a família.
A verdade é que os pescadores mais idosos de chicharro consideram que “nunca viram nada assim” em mais de 40 anos que andam na actividade da pesca. É que não existe chicharro, mas também o atum ainda não aparece nos mares dos Açores. O único atum patudo que se vê no mercado de Ponta Delgada é transportado por traineiras que o pescam nos mares da Madeira e o descarregam na lota de Ponta Delgada. Ontem, este atum estava a preços entre os 5 e os 7 euros o quilo, um preço que até não é muito elevado.
Entretanto, os barcos ‘chicharreiros’ – já com as canas de salto e vara a bordo para a possibilidade de aparecer atum – têm pescado alguma lula e pequenas sardinhas, um pouco acima da petinga, para poderem ter um rendimento mínimo mensal que ronde os 100 a 200 euros. E, pelo andar dos últimos dias, o que vão ganhar não irá chegar a estes valores.
Cada um dos onze barcos do chicharro tem uma tripulação de oito a 10 pescadores, contando com o maquinista. Estamos a falar de 111 famílias que vivem a dificuldade de o seu ‘cabeça de casal’ ir todos os dias para o mar durante a noite e regressar a terra sem chicharro. Se cada família tiver uma média de 6 pessoas, são 666 pessoas que estão a entrar em graves dificuldades económicas.
Até agora tem sido abafada a indignação dos pescadores contra os golfinhos. Mas, na verdade, o que dizem a plenos pulmões é que, ao se deixar de abater golfinhos nos Açores desde meados dos anos 80 – e como o golfinho está no topo de cadeia alimentar – a densidade de chicharros nos mares açorianos tem vindo a diminuir até aos nossos dias.
Contudo, não há estudos que apontem como razão para o desaparecimento do chicharro o aumento do número de golfinhos no mar dos Açores como não existem estudos que apontem para qualquer outra razão.
Quando se fala desta questão com Liberato Fernandes, da Cooperativa ‘Porto de Abrigo’, o responsável associativo é muito cuidadoso. O que defende é que se façam estudos para determinar as causas do desaparecimento do chicharro. “Hoje fazem-se muito menos estudos sobre a evolução das espécies piscícolas do que há 20 anos”, afirma. “Deixou de privilegiar a ciência e a sustentabilidade das espécies para se usar o dinheiro em betão”, referiu para depois concluir: “Ciência que não serve para apoiar a actividade produtiva, é uma ciência sem utilidade”.
Liberato Fernandes tem defendido uma solução para a pesca nos Açores que não é muito pacífico. Afirma que as embarcações deveriam parar dois meses por ano, com rendimentos pagos aos pescadores por fundos comunitários, conforme está estipulado em regulamentos da União Europeia. É o que se chama “pagar para não pescar”.O Secretário da Pescas, Gui Menezes, afirma que a União Europeia só paga aos pescadores para não pescarem durante determinados períodos do ano numa situação de ruptura do stock. Liberato Fernandes responde que não se explica que estes fundos comunitários também contemplam razões de precaução para que os stocks não entrem em ruptura.
O que é um facto é que os pescadores de ‘chicharro’ estão numa situação de total indefinição e não sabem o que vai acontecer a seguir. “Estamos, assim, ao Deus dará, numa situação de total desgraça sem saber com que rendimento é que vamos viver nos próximos tempos”.
E, na verdade, se nos próximos dias não aparecer chicharro, os barcos ‘chicharreiros’ vão desistindo de ir para o mar à procura de peixe porque só vão gastar dinheiro em combustível.
Fonte: Correio dos Açores