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As margens de comercialização que levam os açorianos a serem os portugueses que menos consomem peixe em todo o país
Um estudo do Instituto Nacional de Estatística indicava que são os açorianos que, de entre as várias regiões portuguesas, menos compram peixe no âmbito do volume anual de compras que fazem. Esta realidade estatística é, à primeira vista, incompreensível porque os Açores são nove ilhas, cada qual com portos de pesca que ficam a curtas distâncias dos postos de venda ao consumidor. Além disso, como prova o inquérito de rua feito pelo Correio dos Açores, a maioria esmagadora dos açorianos gosta de comer peixe mas os preços são tão elevados no consumo que o seu orçamento familiar lá não chega.
O Director Regional das Pescas, Luís Rodrigues, disse ao Correio dos Açores estar a acompanhar esta situação. Acrescentou que a Direcção Regional das Pescas foi sempre cuidadosa com a liberalização do preço do peixe que surgiu “por pressão do movimento associativo”. Prometeu mais esclarecimentos para próxima edição.
A Inspecção as Actividades Económicas foi clara na resposta que deu ao Correio dos Açores: “a AIRAE não tem recebido qualquer tipo de denúncia relacionada com esta matéria. Com a liberalização do preço do pescado, o preço ao consumidor passou a funcionar de uma forma livre, resultando este (o preço) do que o mercado oferece e da concorrência existente, não havendo por isso matéria a fiscalizar por parte desta IRAE”.
Ora, o preço médio anual do pargo o ano passado foi de 7.84 euros em lota e o seu preço chega a atingir os 15 euros e mais no consumo. Para o Pargo, houve meses a que ele esteve na lota a 6 euros e meses em que esteve a 10 euros.
O preço médio anual do besugo, em 2016, foi de 3.94 euros em lota. E o besugo é um peixe que chega a atingir no mercado preços próximos dos oito aos dez euros.
A garoupa, por exemplo, foi vendida o ano passado em lota a um preço médio de 4.90 euros. Começou por ser vendida ao preço médio de 6.48 euros em Janeiro mas o preço veio para uma média de 4.50 euros no meio do ano. Esta espécie estava ontem no mercado, conforme o tamanho, entre os 9 e os 11 euros, praticamente o dobro do preço a que foi comprada na primeira venda.
O bodião vermelho é outro exemplo gritante da grande diferença de preços entre o preço de lota e o preço ao consumidor. O preço médio em lota ao longo do ano foi de 3,37 euros o quilo. A meio do ano chegou a estar a um preço médio por mês de 2,70 euros o quilo. O bodião vermelho chega a estar no mercado, como anteontem aconteceu, a 9 euros o quilo.
O boca-negra foi vendido o ano passado a um preço médio de 5,69 euros o quilo. Em Junho chegou a ser vendida em lota a um preço médio de 4.20 euros depois de em Janeiro ter atingido o preço máximo médio por mês de 8,72 euros o quilo. Depois, ao longo do ano, o preço médio por mês não ultrapassou os seis euros. Esta é uma espécie que, normalmente, chaga ao mercado – consoante o tamanho – entre os 8.50 e os 10 euros o quilo e chega mesmo a preços mais elevados.
Mais um exemplo: o preço médio anual o ano passado do cântaro rondou os 5,84 euros. O preço médio por mês mais elevado foi atingido em Janeiro (8.16). Todos os outros preços médios por mês andaram entre os 4 e os 6 euros. Fomos encontrar no Mercado da Graça esta espécie a 16.50 euros o quilo. Dá até para questionar se este cântaro seria dourado.
As espécies mais baratas vendidas tão caras
A espécie com uma diferença abismal entre o preço médio de venda em lota em 2016 (1.83 euros por quilo) é o peixe-porco que depois chega ao mercado a 5, 6 e a 7 euros o quilo. O facto de se ter que tirar a pele ao peixe e, em alguns casos, coloca-lo em filetes prontos a consumir não explica a grande diferença de preços.
E temos também o exemplo incrível do preço da raia. O preço médio anual o ano passado foi de 1,51 euros. Em nenhum dos meses de 2016 o preço médio ultrapassou os dois euros por quilo. Fomos encontrar raia sem pele, limpa, a 9 euros o quilo, o que levou um comprador a questionar o comerciante: “Os pescadores queixam-se que os seus rendimentos não dão para sustentar a família e vocês a venderem a raia a 9 euros…”. A resposta do comerciante foi sintomática: “Isso é com o meu patrão”. Se é verdade que a raia estava pronta a ser consumida, o trabalho para a limpar não justifica que apareça no mercado a 9 euros o quilo depois de ter sido comprada na lota a menos de dois euros.
Aquela espécie que tem servido sempre de mote para explicar que os pescadores ganham muito pouco e que os consumidores pagam muito caro é o chicharro. O preço médio anual do chicharro em 2016 foi de 2.26 euros. Os meses em que o preço médio mensal foi mais elevado na lota foram Outubro (3.01 euros o quilo) e Novembro (3,06 euros o quilo). Ora, o chicharro ao longo do ano de 2016 chegou a atingir junto dos consumidores os 12 euros por quilo. Anteontem o chicharro foi vendido na lota de Ponta Delgada ao preço médio de 4.60 euros e chegou ao mercado a 8.30 euros o quilo e o mais grado (que tem um valor muito inferior em lota) a 4.50 euros o quilo.
E vamos para o exemplo da cavala. O preço médio anual da cavala em 2016 foi de 1.71 euros o quilo. Em nenhum mês do ano o preço médio ultrapassou os dois euros o quilo. Ao longo do ano nunca vimos cavala no mercado com preço inferiores a 3.50 euros o quilo. Na lota, a cavala foi vendida a 1.70 euros o quilo. No Mercado da Graça, em Ponta Delgada, a cavala estava a 5.50 euros o quilo.
Nos preços da lota não aparece o preço médio da sardinha. Mas, por acaso, anteontem, apareceu sardinha na lota a 1,20 euros o quilo. Esta sardinha estava a ser vendida ontem no Mercado da Graça a 3.30 euros o quilo.
O preço médio anual da tainha em 2016 foi de 2.19 euros o quilo. O mês em que o preço médio desta espécie foi mais elevado foi Janeiro (2.77 euros). Em Outubro do ano passado o preço médio mensal desta espécie foi de 1.86 euros o quilo. Estava no Mercado da Graça a 5 euros o quilo.
Por mais explicações que os comerciantes tentem encontrar para explicar estas diferenças de preços, o que é visível é que os pescadores são os que menos ganham com o peixe que pescam e os consumidores levam uma tal ‘pancada’ com os preços que o mais barato é comprar carne de frango, de porto e de vaca do que peixe e só comer peixe mesmo duas a três vezes por semana como afirma a maioria dos açorianos que responderam ao nosso inquérito.
O tempo em que havia margens de comercialização para o peixe
É notório que esta grande diferença entre os preços do peixe na lota e o preço do peixe no consumo é resultado da liberalização de preços decidida por portaria Nº 70 de 2013 assinada pelo Vice-presidente do Governo, Sérgio Ávila; e pelo Secretário dos Recursos Naturais, Luís Neto de Viveiros.
Refere-se nesta portaria com três anos), que “não há justificação económica ou social para a continuidade da regulação administrativa do abastecimento e comercialização do pescado fresco na Região Autónoma dos Açores”. A decisão foi tomada depois de Ouvir a Associação de Comerciantes e a Federação das Pescas de então (órgão de cúpula de defesa dos interesses dos pescadores). Não se ouviu a Associação de Consumidores dos Açores. E deixou de haver limites para o preço do peixe ao consumo.
Esta portaria revogou a portaria Nº50 assinada a 17 de Agosto de 1990 pelo Secretário da Economia, Mário Fortuna – actual Presidente da Câmara do Comércio e Indústria de Ponta Delgada – que estabelecia margens de comercialização para o peixe “no sentido de ajustar a abastecimento dos mercados regionais”.
Esta portaria definia pescado fresco como sendo os animais subaquáticos (crustáceos, moluscos, equinodermes, ciclóstomos, peixes, batráquios, répteis e mamíferos) e suas partes, destinadas exclusivamente à alimentação humana, “e que não sofreram desde a sua captura qualquer operação ou transformação, excepto a destinada à sua conservação e refrigeração com ou sem adição de gelo fragmentado simples ou misturado com sal ou que tenham sido conservados a bordo em água do mar ou em salmoura refrigerado”.
Esta portaria do Governo PSD/A em que Mário Fortuna era Secretário da Economia estabelecia que, “na comercialização do pescado fresco, só é permitida a intervenção de um intermediário”.
“É permitido aos retalhistas repartirem entre si o pescado adquirido nas lotas ou postos de vendagem desde que acompanhado de documento da lota ou postos de vendagem nos quais conste a quantidade de pescado por espécie e respectivo preço”.
Estabelecia-se, então, que seria de 25% as margens máximas de comercialização na venda de tunídeos, espadarte, tubarão, pechelim ou de outras espécies semelhantes e por quilograma.
Quando vendidos em postas, isto é, desprovidos de cabeça, vísceras, barbatanas e conjunto opercular a margem de comercialização destas espécies era de 65%.
Estabelecia-se, também, que a margem de comercialização, na venda dos restantes tipos de pescado fresco, com excepção dos crustáceos, sobre o preço de aquisição na lota ou posto de vendagem era de 25%.
Quando o consumidor pretender adquirir o peixe limpo e à posta era permitida a margem de 40% sobre o valor de aquisição na lota.
Foto: www.viajecomigo.com / Susana Ribeiro
Fonte: Correio dos Açores