Social
“Estamos nos Açores a trocar cêntimos por milhões com os tubarões….”

“Estamos nos Açores a trocar cêntimos por milhões com os tubarões….”

Está a crescer, cada vez mais, a tensão entre os pescadores açorianos de tubarões e as empresas operadoras de mergulho com tubarões na Região. Sob o pretexto de ser uma pesca assessoria da pesca do espadarte, a verdade é que esta espécie desapareceu praticamente do mar dos Açores, e os pescadores têm desembarcado nas lotas cada vez mais quantidades de tubarões e animais cada vez mais pequenos. Por sua vez, as empresas operadoras do mergulho com tubarões “não são cegas” e criticam” esta política do coitadinho” que faz com que se receba cêntimos pela espécie na lota, quando todos devem estar apostados em receber milhões de euros pela observação de tubarões.
Esta polémica não é de hoje e ganhou força com o incremento do turismo nos Açores e o aumento de turistas que se deslocam à Região para mergulhar com tubarões. Volta, agora, novamente à ribalta por se ter identificado cações de muito pequena dimensão a quase seis euros o quilo numa superfície comercial de Ponta Delgada. Cortaram a cabeça e o rabo do cação, abriram-lhe a meio e está pronto para um churrasco ou para um guisado. Mas será isso o que interessa mais aos Açores?

 

Cação de centímetros a seis euros nas lojas

Desde logo, no caso específico do cação, os biólogos não têm dúvida. “Os cações são animais muito importantes para o equilíbrio ambiental das zonas costeiras. São eles que “removem” os peixes doentes, que ajudam a seleccionar os mais aptos, etc. Num ambiente já pressionado pela pesca, os grandes predadores, como são os cações, ficam muito expostos (dado os seus baixos números), pelo que a sua captura pode ser particularmente danosa”.
Mas, a par dos aspectos biológicos, a grande questão que se coloca é o mergulho com tubarões como actividade económica. Até hoje, o Governo dos Açores tem-se mantido, segundo Paulo Reis, presidente da Associação de Operadores de Mergulho da Região, “mudo e calado” sobre este tema. Afirma que não existem informações precisas sobre as quantidades de tubarões nos mares dos Açores, a não ser os que são avistados pelos mergulhadores.
“O facto é que”, afirma Paulo Reis, “ nós mergulhamos todos os dias com os animais e notamos, a olhos vistos, o seu desaparecimento. Há também a explicação das alterações climáticas. É um facto, não as podemos negar. Nós também as vemos todos os dias no mar. Mas estas alterações climáticas não explicam tudo, nem pouco mais ou menos”.
Paulo Reis afirma que zonas protegidas como o Ilhéu de Vila Franca, as Formigas, como o Banco D. João de Castro, “estão a ser saqueadas constantemente, ficamos seriamente preocupados com a política do coitadinho. Aquelas imagens que se viram em São Jorge (descarga de tubarões) dão-nos a nós operadores vontade de chorar. Aquilo é triste. Cada animal daqueles vale milhões. As pessoas vêm aos Açores para mergulhar com tubarões e se não tivermos tubarões, as pessoas não os vêem. E, numa altura, em que infelizmente existe tanta instabilidade política a nível mundial, os Açores estão tão perto, são uma zona euro e têm uma coisa que, infelizmente para alguns mas felizmente para nós, são extremamente seguros. O facto é que os Açores são um destino turístico extremamente seguro e que deveriam estar a ser protegidos”.
“E, neste momento, em termos de mar, o mergulho com tubarões está muito mau. Digo-lhe isso claramente e se falar com qualquer operador de mergulho vai ouvir as mesmas palavras, que isso está muito mau”, salienta.

 

Acabar com a política do coitadinho

“Felizmente”, prossegue, o Comandante Naval dos Açores e Capitão do Porto de Ponta Delgada “tem reforçado, de forma muito significativa, a vigilância e tem, dentro daquilo que são as competências dele, aplicado coimas e feito fiscalização com os meios que tem”.
O Governo regional, numa experiência piloto, montou câmaras de alta resolução em Santa Maria e em São Jorge que “penso que são um elemento dissuasor”.
Agora, entendo que Mas as ‘Formigas’ estiveram, durante anos, “a saque, mas completamente a saque para uma reserva que tem quase 30 anos. Este ano, com o esforço de fiscalização, viu-se poucos barcos junto à zona das Formigas mas, nos anos anteriores, havia todos os dias barcos por perto”.
Paulo Resis deixa claro que “não está a criticar uma classe profissional toda. Estou aqui a criticar dois a três criminosos que, com a política do coitadinho, não só estragam a sua vida como também estragam a vida de quem trabalha a sério em zonas onde se devia estar a desenvolver peixe para, no futuro, outros quisessem apanhar”.
“Hoje em dia vamos fazer um mergulho às Formigas e saímos de lá escandalizados porque não vê nada. E quando falamos de actividades criminosas, não podemos continuar ‘a dar bola’ para eles continuarem a roubar aquilo que não pertence à pessoa A nem à ilha B, mas pertence a uma Região e pertence, acima de tudo, à Marca Açores e, em ultima linha, aos nossos filhos e aos nossos netos. Temos de salvaguardar os nossos recursos e, acima de tudo, temos de salvaguardar as gerações futuras e o nome da Marca Açores. Se não houve tubarões para mostrar, vai ser muito mau para toda a gente.

 

Trocar cêntimos por milhões

Num passado recente, o tubarão não tinha grande valor comercial nos Açores e as capturas eram muito pouco significativas. O grande problema que existe com os tubarões coloca-se ao nível do Atlântico. O problema tem a ver principalmente, com Portugal e Espanha. A frota long line dedicava-se, essencialmente, à captura de espadarte. A diminuição significativa do stock de espadarte e a procura das barbatanas de tubarões pelo mercado chinês, levou a que os que não ousavam pescar tubarões porque havia alguns perigos (há casos de tripulantes que foram mordidos por tubarões), começassem a apanhá-los. Ora, a escala é muito maior do que aquela que existe nos Açores.
“O facto é que”, recorda Paulo Reis, existe um estudo da Doutora Júlia Bento, feito há algum tempo, que prova que a o mergulho com tubarões é uma indústria que, potencialmente, pode gerar milhões de euros na Região Autónoma dos Açores. “E também sabemos que, sendo a Região Autónoma um destino cada vez mais em voga conhecido pela natureza e pelo seu prestígio, estão a ser publicados artigos na Austrália, no Reino Unido e em Espanha, que vêm denegrir a imagem dos Açores enquanto destino de natureza precisamente porque todo o mundo está a proteger os tubarões e se descobriu que gera uma fortuna ligado ao turismo”.
“ Atenção”, salienta Paulo Reis, que “digo isso com muito respeito pela pesca profissional. Não ponho aqui em questão a sobrevivência e a sustentabilidade dos pescadores profissionais nem pouco mais ou menos. Mas, a verdade é que estamos a trocar cêntimos por milhões”.
O preço médio de um mergulho com tubarões nos Açores é de 160 euros por mergulhador. “Mas não nos podemos esquecer que em cima destes 160 euros existe uma tarifa aérea para vir aos Açores. Existe, no mínimo dos mínimos, uma dormida. Eles têm que fazer, pelo menos 24 horas e, portanto, têm de ficar um dia a mais nos Açores. Têm de dormir nos Açores até porque os mergulhadores não podem viajar e mergulhar no dia a seguir . Existe, no mínimo, mais uma a duas refeições e mais dinheiro que se gastou num café ou num pub. Estamos, assim, a falar numa economia assente num simples mergulho”, palavras de Paulo Reis.

 

Deixar de vender tubarões nas lojas de São Miguel

Entretanto, prossegue, “existem grandes grupos económicos que têm supermercados mas que estão também muito ligados ao turismo e vendem tubarões nas suas lojas. Acho que estão a dar uma imagem muito negativa e diria quase terceiro-mundista comparado com o que se está a fazer em alguns países que, nós, europeus, temos a mania de chamar terceiro mundo, mas que já chegaram à conclusão que o turismo gera muito mais dinheiro.
“Como tal”, adianta, “é com alguma tristeza que vemos sectores, principalmente em São Miguel, onde o turismo está fortíssimo, que estejam a vender tubarões nas suas lojas. Até suspeita-se que os níveis de metais pesados, nomeadamente de mercúrio ultrapassam aquilo que é aconselhado para consumo humano. Ou se não ultrapassam, estão lá muito perto. Pelo menos, não é, certamente, recomendado a grávidas andar a comer tubarão por fetiche numa Região que, hoje em dia, é conhecida a nível mundial, pelo seu turismo de natureza, achamos que é contraproducente”.
Anuncia que “até já houve operadores que, inclusivamente, já sugeriram criar uma taxa sobre o mergulho com tubarões para que esta taxa reverta para o Fundo Pesca. Sabemos que, com as quantidades de tubarões que se está a pescar nos Açores, a espécie não se aguenta. Os recursos estão a ser delapidados a uma velocidade estonteante. É verdade que há também aqui questões ambientais que estão a mudar os habitats nos oceanos. Mas o El Nino e as questões ambientais não explicam tudo o que o que se está a passar. O Faial, que é a zona mais forte dos Açores para mergulhar com tubarões, passou de sete a oito animais para um a dois. Passou de um tempo de espera de meia hora para quatro horas para aparecer um animal. Em Santa Maria, simplesmente, desistimos porque de 100% passamos para zero em cinco anos. Não vale a pena levarmos os clientes para estarmos a mostrar atirar engodo para a água para aparecerem tubarões porque eles não existem. É com tristeza que muitos operadores vêem esta realidade”.
Em contrapartida, hoje em dias, há zonas do México que vivem do mergulho com tubarões, há zonas das Bahamas que vivem do mergulho com tubarões. E estamos a falar, literalmente, de milhões de euros”.
“Os Açores já foram considerados um dos melhores, senão mesmo o melhor sítio do mundo para mergulhar com tubarões, devido às condições climatéricas, devido à alta taxa de avistamentos. Agora, já não é assim”, completa.

 

As pessoas “ficam zangadas com a Marca Açores”

Se vir, há meia dúzia de anos, a grande maioria dos operadores de mergulho dos Açores ponham na sua publicidade na internet com mergulhos com tubarões grandes, e hoje em dia, vemos estes operadores a pôr animais cada vez mais pequenos porque os grandes, simplesmente, não existem. Portanto, eu acho que estamos aqui a dar facadas na Marca Açores. As pessoas não telefonam só zangadas para o Paulo Reis da ‘Paralelo 37’; não é com o Paulo Reis da OAMA. As pessoas ficam zangadas é com a Marca Açores assente na natureza que não é aquilo que era expectável. Verificam que não encontram nos Açores aqui que lhes foi vendido. Nós vemos e até poderei enviar-lhe alguns artigos que têm saído na comunicação social mundial onde vem escarrapachado o nome de Portugal e dos Açores dizendo que isso é muito mau. Se você entrar numa página que se chama Shark Project, vai verificar que eles batem ‘forte e feio’ na Região Autónoma dos Açores”.
“O Faial/Pico é a capital do mergulho com tubarões dos Açores e há fotografia publicadas no facebook, nomeadamente do Nuno Sá, com milhares de tubarões a serem descarregados. Apenas as barbatanas têm valor comercial em mercados como o chinês. O resto é vendido literalmente a três cêntimos o quilo para fazer farinha para animais. Lá está, para um país europeu e uma região que se diz turística, não me parece que este seja um motivo de grande satisfação ou de grande orgulho. Antes pelo contrário, é motivo de preocupação porque esta imagem que estamos a transmitir ao turismo, numa altura em que o turismo cresce cada vez mais nos Açores e que as pessoas gostam, não é boa”.
“Em terra estamos muito bem em muitas coisas. No mar também estamos muito bem em outras como a observação de baleias que é uma indústria fortíssima que transmite uma excelente imagem da Região e existem excelentes operadores a trabalhar”.
“E, infelizmente, no mergulho, nós vemos cada vez mais um declínio dos recursos que nos preocupa seriamente”, conclui Paulo Reis.

Fonte: João Paz / Correio  dos Açores

2 Comentários neste artigo

  1. ZÉ PESCADOR

    HÁ TUBARÕES E GOLFINHOS A MAIS JÁ NEM SEQUER DEIXAM PESCAR AS LULAS OS TUBARÕES PREJUDICAM A PESCA É UM FACTO.MAS TEM QUE HAVER LUGAR PARA TODOS

    Responder
  2. mais uma vez só tretras o que há mais no mar é tubaroes

    Responder

Deixe um Comentário