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Juíz João Pedro Coupers sublinha a “atávica tradição centralizadora” de rejeitar o conceito de mar dos Açores
O Tribunal Constitucional decidiu não considerar inconstitucionais as normas do diploma que desenvolve as Bases da Política de Ordenamento e de Gestão do Espaço Marítimo Nacional que, no entender do Executivo açoriano, põem em casa a gestão partilhada pelos governos da República e dos Açores do espaço marítimo em redor das ilhas do arquipélago.
O pedido de inconstitucionalidade foi pedido pelo Presidente do Governo dos Açores, Vasco Cordeiro, que já reagiu ontem à decisão considerando que o entendimento do Tribunal Constitucional sobre esta matéria “é um retrocesso que tem de ser corrigido por via legislativa”.
O acórdão agora conhecido, apesar de não ser favorável às pretensões da Região, apresenta, nas declarações de voto de vencido de cinco Juízes Conselheiros, incluindo o Presidente do Tribunal Constitucional, Joaquim Sousa Ribeiro, argumentos que o Governo dos Açores considera “reforçarem e ratificarem o sentido das pretensões dos Açores” neste assunto.
A começar pela declaração de voto do Presidente do Tribunal Constitucional, Joaquim Sousa Ribeiro, o Governo dos Açores “reforça o facto de nela se reconhecer que há um claro desequilíbrio entre as posições do Estado e da Região no exercício de poderes de gestão sobre o espaço marítimo adjacente ao arquipélago” e que existe uma “clara subalternização do papel da Região na gestão de um espaço marítimo que, no que concerne ao mar territorial e à plataforma continental, não deixa de ser território regional”.
O Governo dos Açores realça ainda, na decisão do Tribunal de Contas, a posição do Juiz Conselheiro João Pedro Caupers, quando considera, na sua declaração de voto, ser “difícil de compreender que, estando em causa arquipélagos, conjuntos de ilhas, não se reconheça – que o Estado não reconheça – que o mar assume um significado e uma importância inultrapassáveis para os açorianos e os madeirenses, significado e importância que justificariam amplamente uma especial capacidade de intervenção nos assuntos a ele relativos por parte daquelas comunidades, ambas integrantes da comunidade nacional”.
O Executivo Regional partilha, também, a visão expressa na mesma declaração de voto de que parecem “inadequadas e criticáveis posições hiperdefensivas de supostos interesses do Estado, resultado de uma atávica tradição centralizadora – que, por vezes, na ânsia de rejeitar a existência de um mar açoriano ou de um mar madeirense, até parecem esquecer que açorianos e madeirenses também são portugueses –, posições que assentam numa noção restrita de âmbito regional mas se batem por uma noção excessivamente lata de defesa nacional – com o objectivo, assumido ou escamoteado, de limitar as capacidades de intervenção dos órgãos regionais nos assuntos do mar (e noutros domínios relevantes para as regiões)”.
Além disso, o Governo dos Açores subscreve a posição que a “capacidade de intervenção dos órgãos regionais nos assuntos dos mares que lhes estão próximos deveria ser a maior possível – indo até aos limites da constitucionalidade –, impondo, designadamente, o entendimento da gestão partilhada no sentido da maior intensidade e amplitude possíveis dos poderes de intervenção daqueles órgãos” e de que “deixar as regiões autónomas sem a titularidade de qualquer domínio público marítimo consubstancia uma escolha do legislador ordinário da República: uma escolha mal explicada e insuficientemente fundamentada, assente num simples preconceito.”
Já quanto à declaração de voto da juíza do Tribunal Constitucional, Maria de Fátima Mata-Mouros, o Governo dos Açores salienta a sua posição de que, ao “fazer referências significativas, ao longo do acórdão, à noção de ‘interesse específico’ – assumidamente abolida pelo legislador de revisão constitucional” –, o Tribunal, “aparenta permanecer enredado numa visão das autonomias anterior à revisão constitucional de 2004 ao mesmo tempo que parece adotar uma perspetiva de concorrência de atribuições entre República e Regiões, em vez de complementaridade e cooperação”.
As declarações de voto citadas estão disponíveis, na íntegra, no sítio eletrónico do Tribunal Constitucional.
Afirma o Presidente do Governo, Vasco Cordeiro que, apesar desta decisão do Tribunal Constitucional, “o Governo dos Açores vai continuar a trabalhar neste processo com a mesma determinação e ambição política, nomeadamente, no âmbito do grupo de trabalho já constituído entre Governo da República e o Governo dos Açores para analisar e propor soluções para estas e outras questões relativas ao enquadramento jurídico-político da gestão do mar dos Açores que respeitem os direitos do povo açoriano”.
Posições do Tribunal Constitucional que venceram à tangente
É entendimento do Tribunal Constitucional que “seria mesmo inconstitucional a atribuição de poderes de decisão final quanto ao ordenamento do espaço marítimo nacional aos órgãos de Governo próprio da Região, em detrimento da exclusividade constitucionalmente atribuída aos órgãos do Estado. A manutenção do poder de decisão nesta matéria funciona, aliás, como uma cláusula de salvaguarda relativa a bens cuja integração necessária no domínio público não resulta de considerações relativas à Região, mas ao Estado”, refere-se na decisão.
“A regulação dos poderes de gestão do domínio público marítimo estadual é matéria que extravasa do ‘âmbito regional’, e assim, deverá ser elaborada pelo legislador da República”, realça o Tribunal no seu parecer.
No entender do Tribunal Constitucional, os poderes de decisão quanto ao ordenamento, programação e planeamento das utilidades públicas associadas ao espaço marítimo nacional “constituem poderes primários indispensáveis à garantia da subsistência do domínio, razão pela qual não podem ser transmitidos a órgãos de qualquer outra pessoa colectiva pública, para além do Estado”.
“Não obstante a Região ter o direito, concorrente com o do Governo, de elaborar planos de ordenamento do espaço marítimo nacional e, ainda que não o exerça, de ser ouvida no âmbito dessa elaboração, os planos são sempre aprovados pelo Governo, cuja posição, em caso de divergência, prevalece sobre a da Região”.
Salienta o Tribunal Constitucional no seu parecer que “afigura-se-nos, pois, que é bastante questionável a possibilidade do Estado abdicar do poder de ordenar o espaço marinho, transferindo o seu exercício para as regiões autónomas, ainda que parcialmente. Nessa hipótese, ficaria despojado de um instrumento fundamental, porventura o mais essencial, à regulação e protecção do domínio público marítimo”.
No entender do Tribunal, “as especificidades regionais que podem estar em causa não são naturalmente especificidades materiais ou substantivas, mas antes adaptações orgânicas, formais e procedimentais”.
A questão da ‘gestão partilhada’
Realça, que os poderes instrumentais de gestão dos bens do domínio público marítimo adjacentes à Região Autónoma dos Açores “devem ser objecto de um exercício conjunto no quadro de uma gestão partilhada, assegurando a existência de mecanismos institucionais que permitam a ocorrência de fluxos de comunicação e manifestação de vontade”. Entende, em sequência, que os mecanismos institucionais destinados a concretizar o conceito difuso de ‘exercício conjunto no quadro de uma gestão partilhada podem variar em função das matérias concretas e dos objetivos específicos, conquanto assegurem a possibilidade de uma real e efectiva ponderação da vontade dos órgãos da República e dos órgãos da Região”.
O acórdão do Tribunal Constitucional deixa claro que “num domínio em que existem atribuições de exercício comum e repartido tem que haver uma definição prévia daquilo que pode ou não ser partilhado, assim como dos termos concretos em que se processa a partilha, a que acresce, como é natural, que a própria definição do que pode, ou não, ser partilhado, nunca poderá ser tomada de modo unilateral e sem um processo de coordenação e concertação entre os órgãos de soberania e os órgãos de governo próprio das regiões autónomas”.
Segundo o Tribunal Constitucional, a codecisão dos planos de ordenamento “tem o inconveniente de poder comprometer a eficiência e eficácia administrativa, uma vez que a exigência de consentimento ou de um acto de união de vontades no momento decisório do procedimento é suscetível de gerar situações de inefectividade, como aconteceria caso um dos órgãos intervenientes se recusasse a decidir ou vetasse as propostas e os pareceres do outro”.
Refere, por outro lado, “…em paralelo com as actividades ligadas à soberania nacional da competência exclusiva das autoridades estaduais – outras actividades de carácter estritamente económico possam ser desenvolvidas pelas Regiões Autónomas” no espaço marítimo que as rodeia – o que é considerada uma visão muito redutora.
«No quadro de uma gestão partilhada entre o Estado e as Regiões Autónomas, o presente decreto-lei distingue o ordenamento do espaço marítimo nacional da atribuição dos títulos de utilização privativa. De forma a garantir a unidade do território e uma visão integrada do espaço marítimo nacional, prevê-se que compete ao Governo coordenar as acções necessárias ao seu ordenamento. Já no que respeita aos títulos de utilização privativa, a sua atribuição compete aos órgãos e serviços competentes das Regiões Autónomas».
Significa isto, no entender do Tribunal Constitucional, que para o legislador ordinário, os conceitos de «gestão» e de «ordenamento», assim como «poderes de gestão» e os «poderes de ordenar», são funcionalmente distintos e actuados por procedimentos e por entidades de natureza diferente.
Fonte: Correio dos Açores