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Mar de Incertezas

Mar de Incertezas

O mar é, e sempre foi, motivo para as mais variadas conjeturas. Desde que há registos, serviu para poetas, pensadores, navegadores, pescadores, biólogos, doutores e afins e tantos outros opinarem acerca de um bem vital para a biodiversidade deste planeta em que vivemos.

Hoje fica bem falar do mar, embora para muitos somente seja conhecido dos horizontes cada vez mais restritos. No tocante ao nosso mar (a cada dia menos nosso) há tanto para dizer que, vendo bem, temas não faltam. Irei hoje como o fiz ontem e farei amanhã referir-me às pescas.

Continuamos, como sempre, salvo raros períodos, sem rumos definidos ou seja, não há linha orientadora quer para a frota de pesca regional, quer para as diferentes pescarias.

A inexistência de um plano regional devidamente estruturado que contemplasse por um lado o número de embarcações e respetivas licenças de pesca para uma determinada pescaria, bem como o exercício descontrolado da pesca conduziu uma atividade fundamental da nossa economia ao quase colapso.

Exemplos da “navegação desgovernada” a que temos assistido são vários: construção e abate de embarcações “sem rei nem roque”, autorização e venda de embarcações financiadas com fundos regionais a empresas exteriores à Região; passagem e renovação de licença de pesca a embarcações que operam na Região com companhas exteriores em concorrência com as nossas empresas, sabendo-se que estão a contribuir decisivamente para a desgraça que aí vêm; introdução de cotas de pesca para espécies como seja o Goraz, Alfonsim, Imperador tal como acontece com o Bacalhau etc.; não se tendo em conta as reais diferenças, bem como os métodos de captura, negociação e perda de metade da nossa ZEE sem se contabilizar os pesados custos para a economia Regional; reduzido contributo efetivo da Universidade dos Açores na elaboração da legislação relacionada com as pescas; conceção de licenças e financiamento na Ilha de São Miguel para 23 embarcações utilizarem redes de cerco na pesca do chicharro quando somente 2 já seriam mais que suficientes; incentivo à captura em quantidade de diferentes espécies de atum em detrimento da qualidade quando se sabe ou devia saber que à exceção do Bonito todas as outras são um bem cada vez mais escasso e com fortes restrições a nível internacional; fraquíssimo grau de alfabetização dos pescadores Regionais; manutenção da grande maioria dos pescadores Regionais (ilhas inteiras) no subsidiodependência do FUNDOPESCA, (250€ por pescador), o que, certamente, nos envergonha e é a prova evidente da falência da quase totalidade das nossas pequenas empresas de pesca. Clamorosa falta de uma política Regional de apoio á comercialização do pescado proveniente da frota regional que tem que passar forçosamente pelos transportes aéreos e marítimos e de uma vez por todas impedir que se continue a vender, por exemplo, Perca do Nilo por Cherne dos Açores!

Por muito que nos custe, as pescas tem sido geridas por “interesses” cujos “interesses” pouco tem a ver com os nossos, de pequenos armadores e pescadores, tem sido ainda como um navio que, navegando sem rumo, ora vai para Sul com o vento Norte, ora para Norte com o vento Sul, um dia encalha ou afunda e esse dia aproxima-se com a previsível paralisação da nossa frota, lá para Agosto ou Setembro quando terminar a cota do Goraz que, erradamente, introduziram na Região como método de gestão do stock quando, muito pelo contrário, deveria ser por licença e arte de pesca dimensionando-se e adaptando-se a frota regional para as diferentes potencialidades do nosso mar. A gestão das pescas Açorianas carece de gestores que, para além da ciência, tenham conhecimento prático do que é o mar e acima de tudo do que por lá acontece!

Participei no processo de transformação da frota Regional que até ao início dos anos 80 do século passado era quase exclusivamente constituída por pequenas embarcações artesanais de boca aberta e pelas traineiras do atum, o que teve impacto altamente positivo nas nossas pescarias e na elevação do modo de vida dos pescadores. Hoje é com tristeza que assisto a falência de muitas das pequenas empresas que então surgiram. O que cada vez se vê mais nos portos são embarcações inativas, ou mesmo abandonadas!

O pior que nos pode acontecer é continuar a “navegar” neste mar de incertezas, sem rumo.

Horta, 20 de Abril de 2015

Fonte: Genuíno Madruga in Tribuna das ilhas

2 Comentários neste artigo

  1. Sr Genuino, percebo as suas palavras, mas quando o dinheiro andou aos montes por ai, e aumentou-se a frota ou foi melhorada, alguem pensou no aumento do esforço de pesca que isso implicava? não me parece….Cada um pensou por si!!! Se acha que vamos perder zonas de pesca… ainda a procissão vai no átrio, porque senão for provado que a frota regional usa de forma efetiva toda a zona da nossa ZEE, a alegação para a diminuir será logica..” não tem frota que utilize tanto espaço” Pior é que sabemos que não temos plataforma continental, são montes submarinos , mas para quem decide e está sob ação provável de lobbies como o espanhol, nem vão querer saber…acho que uma parte do problema passa por acabar com palangre…A Terceira e S. Miguel tem um papel importante nisso…acabar com o palangre vai acabar com muitos empregos legais e não legais , mas vai ter um impacto positivo no ganho dos pescadores…menos peixe , mais bem pago… e Não é só o fundo pescas…é subsidio de gasóleo, o poseima…Parece-me que o que é necessário fazer, já não é tanto politico mas mais técnico e isso não é “interessante” da prestativa politica…o tempo vai-lhe dar razão…infelizmente. Não me parece que os açorianos tenham de comer cherne, ou goraz, ou rocaz…se existe um mercado que paga melhor, quem quiser comer desse peixe tem de pagar…o pescador só ganha vendendo bem, é essa realidade. O sector não é organizado e fazer depender o seu sucesso de terceiros(governo regional), não me parece viável…o futuro vai se encarregar de mostar o caminho que será muto difícil para quem ficar com o ónus de tomar decisões…

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  2. ILUSTE E “SÁBIO”GENUINO MADRUGA, COM QUE ENTÃO LÁ PARA AGOSTO E SETEMBRO A FROTA PARALIZAVA PORQUE SE TINHA ESGOTADO A COTA DE GORAZ.NÃO ACHO ESTRANHO QUE O SECRETÁRIO REGIONAL NÃO PERCEBA NADA DISTO, COMO O SEU ANTECESSOR ,PÃODELONA, AGORA VOCÊ EU ACHO ESTRANHO OU ENTÃO TAMBÉM NÃO PERCEBE ASSIM TANTO.QUANDO NO FINAL DE MARÇO/PRINCÍPIO DE ABRIL, QUANDO SE ESTAVA A APANHAR MUITO GORAZ COMENTEI AQUI QUE TINHA MUITAS DÚVIDAS QUE ATINGISSEMOS A COTA, DÚVIDAS QUE MANTENHO…SIMPLESMENTE PORQUE NÃO HÁ GORAZ….CONTINUO A ACHAR QUE NÃO CHEGAREMOS À COTA, MUITO MENOS ÀS 100 TONELADAS A MAIS QUE AINDA FORAM DADAS, PELO QUE O FECHO DAS PESCARIAS NA ULTIMA QUINZENA DE JULHO SE MOSTROU INÚTIL.

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