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Os peixes estão a encolher

Os peixes estão a encolher

Apesar das políticas de proteção, os peixes estão mais pequenos e menos férteis. A evolução e a genética podem explicar o mistério.

Quando se começaram a adotar políticas e tratados internacionais de proteção das espécies de peixes ameaçadas, impondo limites à captura dos mais jovens ou mais pequenos, o objetivo era claro: concentrar a pesca nos mais velhos e maiores e deixar viver os mais novos, para se multiplicarem e contribuírem para a próxima geração.

Os cientistas e os ambientalistas ficavam satisfeitos, porque estas políticas protegiam os peixes; e os pescadores também, porque concentravam a sua atividade na captura de animais maiores e mais gordos, bem cotados no mercado. Mas a partir da década de 1980 os biólogos constataram que os peixes estavam a crescer menos, atingiam a maturidade sexual mais cedo e punham menos ovos, o contrário do que seria de esperar das políticas de proteção. Com uma agravante: os peixes mais pequenos valem menos no mercado.

As explicações para o fenómeno apontam para o declínio das fontes de alimento ou mudanças ambientais (poluição, clima), mas como refere um artigo recentemente publicado na revista britânica “Nature”, há cientistas que defendem que os peixes se estão a adaptar, em termos de evolução, às restrições à captura dos mais pequenos, investindo a sua energia em alcançar a maturidade sexual mais cedo, em vez de crescerem mais. Os académicos não negam que a sobrepesca é a maior ameaça aos stocks pesqueiros e dizem que esta pressão sobre a evolução dos peixes irá ter um impacto negativo muito difícil de reverter no futuro. Mikko Heino, biólogo da Universidade de Bergen (Noruega) que defende esta teoria, investigou o que se passava a nível genético, começando pelo bacalhau da Noruega, muito consumido em Portugal. Heino pegou em amostras do ADN de bacalhaus adultos com tamanhos diferentes, conservados nas últimas décadas, e procurou mudanças no crescimento e desenvolvimento dos genes que explicassem cada tamanho. Depois desenvolveu uma técnica probabilística que integra pela primeira vez as variações de crescimento do bacalhau devido à disponibilidade de alimentos, ao clima ou a outros fatores ambientais.

O biólogo concluiu que os peixes nascidos mais recentemente estavam de facto a atingir a maturidade mais cedo e eram mais pequenos. Verificou também que estas mudanças precederam um forte colapso do bacalhau no Canadá. A técnica de Heino foi depois usada no estudo de 37 stocks de outras espécies e as conclusões foram idênticas.

Margarida Castro, bióloga do Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve, diz que a teoria tem vários problemas, porque “há grande dificuldade em separar as respostas comportamentais ou adaptações fisiológicas dos peixes dos efeitos genéticos”. Mesmo sem seleção genética, a remoção dos animais maiores “pode levar a alterações na idade da primeira maturação”. Assim, sem a presença dos grandes, os mais pequenos podem não sentir a competição e “maturar mais cedo”.

Sardinhas reproduzem-se cedo

Depois, “do ponto de vista experimental, é praticamente impossível separar efeitos ambientais (qualidade e quantidade de alimento, por exemplo) de efeitos genéticos, na diminuição do tamanho e idade da primeira maturação”. E mesmo que se tenham verificado alterações no tamanho médio ao longo do tempo, “nada prova que sejam sobretudo devidas à pesca”. Mas a bióloga ressalva que “o bom senso e o conhecimento da genética associada ao melhoramento animal em espécies domesticadas leva-nos a considerar que é altamente provável que a pesca tenha um efeito negativo na manutenção da diversidade genética”, podendo remover sistematicamente das populações “os indivíduos com maior fitness”. Só que introduzir medidas de gestão que obrigassem a proteger os peixes grandes, como cortes severos nos níveis de pesca ou criação de mais zonas protegidas, “não é solução para a quase totalidade dos recursos pescados, porque nenhum pescador comercial iria cumpri-las”.

Alexandra Silva, Cristina Nunes e Manuela Azevedo, da Divisão de Modelação e Gestão de Recursos da Pesca do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), reconhecem também, em declarações escritas ao Expresso, que “apesar de haver stocks que mostram uma tendência para uma maturação precoce, em muitos casos não é possível destrinçar as causas desta, uma vez que pode ser devida a uma adaptação da espécie ou a alterações genéticas, ou a ambas”. Estes problemas foram estudados pelo IPMA em algumas espécies da costa portuguesa. No caso da sardinha, observou-se que o potencial reprodutivo das fêmeas varia significativamente com o seu tamanho, estimando-se que uma fêmea com 22-24 cm produza por ano três a quatro vezes mais ovos do que uma fêmea com 16-18 cm.

O peso dos fatores ambientais

Desde a década de 1970, há a tendência para as sardinhas iniciarem a reprodução com um tamanho mais pequeno. Só que as investigadoras associam este facto “a alterações nos fatores ambientais — como a subida da temperatura da água — e ao aumento da quantidade de gordura armazenada no verão para investimento na reprodução”.

A maioria dos recursos pesqueiros explorados em Portugal “usa artes diversificadas, que capturam uma gama alargada de tamanhos, o que diminui o risco da sobre-exploração dos peixes mais velhos”. Uma pesca assim “terá maior probabilidade de garantir a diversidade genética e a resistência dos stocks”, ou seja, a sua capacidade de adaptação e recuperação a condições adversas. O detentor da cátedra CGD Estudos do Mar da Universidade de Aveiro, Graham John Pierce, argumenta por sua vez que, “quanto mais cedo um peixe se reproduz, mais hipóteses tem de o fazer antes de ser capturado”, o que significa que a melhor maneira de preservar as populações de peixes “é simplesmente pescar menos”. Vários estudos provaram que “as maiores fêmeas produzem os ovos de maior qualidade”. Por isso, “capturar os maiores peixes é a pior coisa que podemos fazer”.

Fonte: Expresso

1 Comentário neste artigo

  1. john cena

    curto bue de peixe orton

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